segunda-feira, 20 de abril de 2009

De volta ao trabalho

Os últimos dias têm sido atribulados, no bom sentido claro. Na sexta-feira tivémos a honra de participar na recepção ao Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros na embaixada de Portugal no Cairo, onde conhecemos uma pequena parte da comunidade lusa no Egipto. É sempre bom sentir que não estamos totalmente sozinhos nesta aventura.

No sábado e no domingo deu-se continuidade à remoção dos (inúmeros!) derrubes de adobe, revelando finalmente os contornos de um possível piso junto ao lado norte da porta que já havíamos referido em posts anteriores.



Muito próximo da entrada Este desta porta, identificámos e escavámos uma pequena estrutura de combustão com fundo de placa de argila com restos das paredes conservadas. Este revestimento é constituído por um grande contentor de armazenamento provavelmente partido nos extremos (E-O) formando duas paredes. A ausência total de materiais associados e facto de "cortar" as unidades mais antigas poderá significar que se trata de uma estrutura recente sobre a qual não é possível tecer mais considerações. Após o trabalho na área da escavação e de um almoço no deserto, segue-se a inventariação, marcação e fotografia dos materiais.



Hoje foi feriado nacional no Egipto - a celebração da Páscoa Copta - e aproveitámos o tempo livre para gerir alguma informação acumulada, incluido este pequeno post no blog.

Amanhã, o despertador volta a tocar às 5:30. Até lá!

quarta-feira, 15 de abril de 2009

O adobe

Mais um dia normal de escavação no Egipto: despertador para as 5:30, chegada ao campo por volta das 7:00. Quando chegámos as marcas de passagem do Khamsin pela área eram por demais evidentes. Apesar do vento, a definição das distintas realidades começa a ser a recorrente: massas extensas de derrubes e estruturas de adobe e, fossas de maior e menor dimensão, fruto de violações recentes.

Numa dessas fossas, na zona Oeste da porta calcária, encontrava-se outro dos nossos trabalhadores, Ramadan Gab, que carinhosamente apelidamos de "toupeira". Tal facto deve-se à felicidade no olhar sempre que é destacado para áreas, ou de perigo eminente de derrocada, ou de escavação em profundidade. Na temporada de 2008 enfrentou sozinho os perigos de uma fossa/ poço com cerca de 2,40 metros de potência e cerca de 1 metro de diâmetro. Nunca se sente claustrofóbico nestas situações, antes pelo contrário: vai fumando os seus cigarros "Cleopatra" enquanto enche baldes com o sacho.
Quanto à escavação, e de momento, apenas podemos identificar os compartimentos de acesso à porta (fruto de inúmeras violações recentes), e uma grande estrutura (com cerca de 1,5 metros de largura) de orientação N-S que se adossa à porta. Este tipo de realidades já havia sido aferida por Petrie nas suas escavações no topo do Palácio em 1909, pelo que julgamos integrar o vasto complexo de ocupação palaciana e militar datado de Época Baixa. Não obstante, e à excepção da porta, esta é a única estrutura de adobe com os limites bem definidos e que nos permitiu já a identidificação de um primeiro compartimento.

Depois de decorrida a escavação entre as 7 e as 13h, iniciámos o trabalho de tratamento de materiais, com a lavagem de todos aqueles que foram encontrados na unidade superficial [0].

Peças do dia: cabeça de estrangeiro em terracota, figura zoomórfica e pequeno amuleto em faiança (Anúbis).

terça-feira, 14 de abril de 2009

Khamsin


Abril é o mês do Khamsin, o vento do deserto que assola o Egipto com tempestades de areia consecutivas num período de 50 dias (tal como o nome indica, Khamsin significa 50). As condições de trabalho passam a ser ainda mais duras uma vez que a partir da chegada dos ventos do deserto as temperaturas começam a subir para valores abrasadores (entre 35º e 45º). Começa a prova de resistência física para nós e os trabalhadores.

O João Almeida é o único homem da equipa. Arqueólogo e excelente fotógrafo, não temeu vir para o Egipto rodeado de mulheres e não teme subir a escada, segurada por Ramadan e Agag, para fazer as melhores fotos da melhor perspectiva possível.

A escavação continua a bom ritmo e já iniciamos o trabalho do material depois de infinitas dificuldades próprias da burocracia egípcia, também ela parte do trabalho no país do Nilo.

segunda-feira, 13 de abril de 2009

A estrela da equipa


Ramadan é um dos nossos trabalhadores egipcios, mas na realidade é já um membro indispensável da equipa. Trabalha connosco desde a primeira campanha em 2001 e é, sem dúvida, um especialista na escavação de estruturas em adobe. Ninguém define, limita e escava em adobe como o Ramadan. Sempre paciente e muito perfeccionista sorri sempre que encontra “tob” (a palavra árabe para adobe), enquanto lhe toca com o colherim num gesto de total familiaridade.

Nestes últimos 2 dias temos estado a definir uma estrutura calcária, uma possivel porta, que decidimos escavar este ano. Por agora só podemos confirmar que está rodeada por intrusões actuais fruto de possiveis violações, mas esperamos encontrar nives fechados mais abaixo de forma a poder datar com total segurança a estrutura. Nestas camadas superiores convivem ânforas de Rodes, cerâmica do período de Amarna, Terra Sigillata, figuras de Terracota e cerâmica ática.

Amanhã há mais...

sábado, 11 de abril de 2009

De volta ao campo


Hoje foi a volta ao trabalho de campo depois do dia livre semanal (a sexta-feira é o dia de descanso da equipa que aproveita para ir ao Cairo passar o dia entre algumas visitas e compras básicas no supermercado).

Continuamos a escavação na área escolhida para este ano, junto a uma estrutura calcarea que pensamos poderá dar resultados muito interessantes... Por agora estamos em niveis muito superficiais com um altro grau de intrusão, mas como sempre acontece na área da concessão portuguesa, a riqueza de materiais deixa a equipa entusiasmada desde o primeiro momento. Não podemos esquecer que nos encontramos em Mênfis a cidade das cidades do Antigo Egipto.

sexta-feira, 10 de abril de 2009

Conferência na EES...

A equipa portuguesa foi convidada a apresentar uma conferência no dia 6 de Maio às 19.00h na Egypt Exploration Society (conhecida pela sigla EES), no Cairo, com o objectivo de apresentar o projecto e os resultados obtidos até ao momento no Palácio de Apriés.

O convite é por demais significativo tendo em conta que a EES (fundada em 1882) é considerada actualmente uma das principais organizações dedicadas ao estudo e escavação de sítios arqueológicos no Egipto e no Sudão.

Para informação detalhada consultar:
http://www.ees.ac.uk/home/home.htm

quinta-feira, 9 de abril de 2009

Os primeiros dias...

A chegada à cidade frenética e de trânsito caótico correu dentro da normalidade: o calor, as buzinas e os regulares transeuntes que atravessam auto-estradas num autêntico acto suícida. Antes disso, o reencontro no aeroporto da Prof.ª Maria Helena e da Sofia com os restantes membros da equipa foi, no mínimo, efusiva. O espanto de todos aqueles que impacientemente aguardavam a chegada de familiares, amigos ou turistas, revelou-se nesse momento sob a forma de uma gargalhada contagiante e generalizada. Nesse instante entrámos, claramente, numa dimensão distinta.



O dia de ontem foi passado, quase na totalidade, no terraço da casa de Sakkara, onde programámos os trabalhos que hoje se iniciaram. A chegada ao campo foi, para uns, uma novidade e, para outros, o reavivar da memória que a passagem do tempo (entre temporadas) permite. A primeira constatação é a de que efectivamente a aldeia de Mit-Rahîna continua a crescer em redor do Palácio, com ocupações rurais que reaproveitam o fértil e abundante adobe. Entretanto, enquanto os trabalhadores, liderados pelo Reiss Tamer, montavam a tenda, a equipa começou por definir uma área de escavação de 16 X 8 metros na zona Sul do Palácio.

domingo, 5 de abril de 2009

«Palácio de Apriés»: nova temporada de escavações arqueológicas e tratamento de materiais no sítio de Mênfis Kôm Tumân

O sítio arqueológico de Kôm Tuman (Mênfis/ Egipto) será alvo de nova campanha de trabalhos arqueológicos entre 7 de Abril e 7 de Maio de 2009. A concessão arqueológica atribuída à equipa portuguesa, dirigida pela Prof.ª Dr.ª Maria Helena Trindade Lopes (FCSH-UNL), engloba entre outras estruturas: o «Palácio de Apriés (Haa-ib-Ra)», faraó da XXVI Dinastia (589-570 a.C.) e o respectivo "campo de mercenários". Não obstante, as anteriores temporadas já permitiram aferir a existência de materiais que apresentam uma larga diacronia temporal: entre o Império Antigo e a Época Baixa. A Universidade Nova de Lisboa dirige desde 2000, o Projecto Mênfis-Kôm Tumân. A área de concessão deste projecto abrange o “Palácio de Apriés e o seu campo de mercenários”, que após as escavações de Pacha (1901-1902) e Petrie (1909-1913), e das sondagens de Kemp (1978) e da EES (1989), conhece agora novas acções de salvaguarda e investigação.



Kôm Tumân situa-se a norte de Mit Rahîna e a sul do moderno cemitério de Sheikh Said em Kôm Aziz. O sítio abrange uma área de aproximadamente 220 000 m2 e encontra-se hoje rodeado a sudoeste pela aldeia de Ezbet Gabry. O Palácio ergue-se no canto Noroeste da vasta planície, construído sobre uma plataforma artificial de cerca de 13,66 metros de altura. De acordo com Petrie, o Palácio de Apriés foi construído sobre estruturas muito mais antigas (Petrie, 1909: 1; Petrie, 1910: 40-41). Esta teoria encontrou eco em autores mais tardios (Dimick, 1956: 21; Kees, 1977: 148) e, apesar de Petrie não ter confirmado a sua intuição, os objectos e a cerâmica pintada do Império Novo (XVIII Dinastia) que foi encontrada e referida tanto por Petrie como por Kemp leva-nos à possibilidade de as instalações do Império Novo terem servido como base para este Palácio, especialmente se as fundações tivessem sido feitas com recurso a trincheiras (Jeffreys, 1985: 43).



Na temporada de Abril de 2008, a intervenção realizada no limite Este do "campo de mercenários" permitiu a definição de espaços habitacionais em adobe, maioritariamente de orientação N-S. Numa área de páteo foram definidos, um piso de paralelipípedos de calcário e um possível poço. O estudo prévio dos materiais provenientes desta área aponta para uma cronologia do século V-IV a.C.

Ao longo desta nova campanha de Abril de 2009, pretende-se abrir uma nova área de escavação, situada entre a plataforma do Palácio e as rampas de acesso ao mesmo. A equipa será dirigida pela Prof.ª Dr.ª Maria Helena Trindade Lopes, e co-dirigida pela Dr.ª Sofia Braga Fonseca. O resto da equipa irá realizar trabalhos de tratamento de materiais, fotografia de campo e topografia: Susana Bailarim, Teresa Rita Pereira, João Almeida e Patrícia Bargão. Com este blog pretendemos efectuar um "diário de escavação" actualizado e pormenorizado.

Até breve... em Mit-Rahîna.